quinta-feira, 15 de maio de 2014


MAIS SOBRE O CONTROLE E JUSTIÇAMENTOS


Hoje prende-se para perpetuar o dualismo, prende-se os maus, prende-se quem desestabiliza, prende-se quem é inimigo do Estado. Não vamos ressocializá-lo, pois fazemos parte de sociedades distintas, eu não o quero em minha sociedade. Hoje o que quero é afastá-lo de perto do meu convívio, pois eles me chocam. Faço e peço justiça, pois estou do lado do bem, (atavicamente do lado do bem). Enquanto apenas determinados sujeitos são presos, são alvos do justiçamento eu me regozijo e vejo que estou conseguindo garantir minhas benesses. Durmo menos apavorado por isso. O EGOÍSMO E A IGNORÂNCIA SÃO MESMO RECONFORTANTES. 

Arte: latuff
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segunda-feira, 12 de maio de 2014

A QUEM O ASSASSINO MATA?

O serial Killer a luz da criminologia e psicanálise


Depois de um ano de lançamento é um prazer ver o livro (que traduzimos, comentamos e prefaciamos) como o mais vendido em relação às obras com temática de "serial killer" e ver ele entre os mais vendidos também entre os livros de Criminologia. 



Sobre a interseção entre psicanálise e criminologia*:

*prefácio da obra.

A psicanálise talvez mostre ao Direito Penal um novo cenário, novas conjecturas e principalmente reinterprete o sujeito conhecido como réu, a vítima e questione o verdadeiro papel do Estado nessa relação de controle em que vivemos.
A psicanálise pode criticar a estigmatização dos homicidas em série sem cair no lugar comum da inimputabilidade, como sinônimo de irresponsabilidade. Nesta obra, neste sentido, os autores questionam exatamente a inimputabilidade e os efeitos da falta de responsabilização:
 “Este ‘não há lugar’ denunciado por Althusser traduz o estatuto de “morto-viventes” a que fica reduzido o criminoso que é considerado inimputável”
Defende-se então a necessidade de responsabilizar tais indivíduos e principalmente humanizá-los.
O homicida não pode e não deve ser “desresponsabilizado” pelo seu ato e perder o seu status enquanto sujeito, como bem salienta os autores desta obra: 

“Se o sujeito não reconhece sua falta, não pode dar uma significação à sanção que lhe é aplicada pelo delito que cometeu;”

É imperioso que Criminologia, Direito Penal e Psicanálise caminhem juntos na direção do entendimento de nossa sociedade e principalmente edificando garantias e respeito para com todo e qualquer cidadão.
Sem a criação de inimigos caricatos do Estado ou personagens de filmes de suspense. A aproximação da criminologia e psicanálise visa uma sociedade de inclusão, onde a estigmatização de sujeitos e a demonização de pessoas, sejam consideradas, cada vez, mais um recurso ultrapassado e obsoleto.
Um Direito Penal totalmente desconstruído, revisto e constitucionalmente limitado onde vítimas, réus, juízes, defensores e acusadores sejam considerados sujeitos de Direitos e também de Deveres. Um Direito penal realmente de ultima ratio onde a vítima não seja excluída e alijada, e o réu não seja escolhido seletivamente.  

domingo, 11 de maio de 2014

A (IN)EFICÁCIA DO SISTEMA PRISIONAL - DA DESCULTURALIZAÇÃO A DESSOCIALIZAÇÃO DO INDIVÍDUO.*

*CAPÍTULO DO LIVRO: UMA VISÃO TRANSDISCIPLINAR DO COTIDIANO (2014)

arte: rubens jr.
O trabalho hora apresentado tem como objeto analisar o sistema prisional, como paradigma para a discussão do encarceramento como fator dessocializador e sua inserção na engrenagem de controle, estigmatização e verticalização social promovida pelo Estado.
A falência do Direito Penal, já preconizada na obra de Baratta (1999), atenta não só a classe jurídica como a população em geral, para a necessidade de mudanças nos sistemas e preceitos penais e de justiça. E o caráter mais nítido da falência da segurança pública é o sistema prisional, uma vez que é ele o arcabouço induvidoso das políticas públicas sustentadas pela classe dominante, onde impera para Loic Wacquant (2007), a política de punir os pobres.
A história da humanidade segundo Foucault (2004) está repleta de tentativas de reprimir a criminalidade e legalizar os suplícios, as prisões e qualquer outro sistema de repressão contra àqueles cidadãos que supostamente tenham se situado à margem do Contrato Social Rousseaniano.
Nosso país hoje transita entre um sistema de punibilidade excessiva (Direito Penal Máximo), caracterizado por leis mais duras como a lei de Crimes Hediondos e um sistema de abrandamento do sistema penal (Sistema Penal mínimo) marcado por penas alternativas teóricas e não aplicadas. Tais penas alternativas não parecem representar rupturas com o modelo retrógrado penal, mas apenas aditivos, aumentando e legitimando ainda mais o controle formal do Estado.
O Brasil, no campo criminológico, sofre as influências dos movimentos de “lei e ordem” ou de “tolerância zero” que se edificam no ideário do homem médio e se levantam como estandarte de toda e qualquer política pública que almeje coibir o aumento da criminalidade. Como bem salienta Thompson (2002), tais movimentos e políticas são bem conhecidos em nosso país, nos acompanham há décadas e até o presente momento não ofereceram soluções reais para o problema e também nunca representaram a diminuição efetiva da criminalidade em qualquer dos seus aspectos.
Passeti (2004) ainda assevera que a sustentação destas políticas de punibilidade máxima tem seus pilares solidificados em nossa cultura pelo patrocínio das classes dominantes. Entre esses pilares, cita o desejo de punição dos “criminosos” pela prática do delito ainda que o ato seja destituído de periculosidade; o pretenso combate a impunidade pela intimidação, que na verdade só acontece contra a classe desfavorecida e dominada; o discurso falacioso da neutralização do indivíduo; e por fim o engodo pós-moderno da ressocialização.
Com vistas aos fundamentos vislumbrados frente à aplicabilidade e eficácia do sistema prisional e a eventual dessocialização do indivíduo, faz-se imperioso considerar e edificar alguns questionamentos acerca da questão carcerária no Brasil.
Portanto, visamos aqui edificar argumentos que respondam a inquietante indagação: se o sistema prisional brasileiro (que tem por base a pena privativa de liberdade e o Direito Penal máximo), corresponde e cumpre a função de ressocializar (!?) e reinserir(!?) o preso na sociedade, não só como consumidor e produtor, mas também e principalmente como cidadão.


arte: latuff



O Brasil padece hoje, no campo criminológico, dos mesmos males que o resto da América latina. Ou seja, a insipiente política criminal é voltada apenas para a segurança pública em uma visão policiesca de todo o sistema de justiça penal. Tal visão reducionista do problema, blindada contra os pensamentos críticos ao sistema criminal, levou o Brasil à situação caótica na segurança pública.
O aparato judicial e o sistema midiático, tal qual conhecemos hoje, tentam encobrir a característica do sistema prisional SEGREGACIONISTA E SELETIVO que retro-alimenta a violência e causa apenas uma oficial e quimérica sensação de segurança, na verdade o que vislumbra-se é a sustentabilidade de uma ordem que garanta as benesses das classes abastadas em detrimento das bases da pirâmide social.
Seguindo nesta esteira, o Sistema Penal Brasileiro exalta a punição como meio de combate a criminalidade e perpetua a pena privativa de liberdade como meio mais “eficaz” para essa punição, sob os auspícios da ressocialização (que nada mais é que uma falacia das classes dominantes).
As análises do sistema carcerário brasileiro põem em cheque a ideologia da Defesa Social, o arcabouço de todas as teorias justificadoras da estratificação social.
A falácia da readaptação social do condenado fica latente ao verificarmos quais os clientes da engrenagem penal, quais os alvos da máquina prisional. As histórias da pena e da prisão deixam claro que os efeitos do encarceramento passam ao largo da fábula da ressocialização.
Fica latente, pelo aumento da massa carcerária, pelas rebeliões cada vez mais freqüentes, pelas conclusões de maus tratos (presentes, por exemplo, na CPI do Sistema Carcerário realizada no Brasil, nesta primeira década do século XXI), aliadas ao crescente aumento da criminalidade, que os movimentos de Lei e ordem e Tolerância Zero, apadrinhados pela classe dominante, em nada contribuíram para a diminuição da violência e das desigualdes sociais.
A ideologia da Defesa Social associada a esse achatamento dos direitos Humanos levou ao recrudescimento da violência e a solidificação de uma sociedade passiva frente a um estado centralizador, violento e ineficaz. E devido a isso, vemos a violência se amalgamar ao eixo da sociedade de maneira indissociável. Onde o Estado falha, ao não dar suporte aos menos favorecidos, não dar condições aos exprobados e ao não socializar os excluídos, o Direito Penal (travestido no sistema prisional) aparece para higienizar.
A pena de prisão hoje não alcança nenhum de seus objetivos, não consegue neutralizar e ressocializar os menos abastados e estigmatizados como quer a classe dominante e, tampouco traz a diminuição da violência e qualquer tipo de pacificação social.
A crise instalada é latente e as soluções, embora dispersas, existem fora da engrenagem carcerária.  A mudança deve partir de nossa estrutura político, social e econômica.
Pois no cárcere o indivíduo rompe com a maioria dos seus laços no mundo exterior, rompe com a família e com amigos e na prisão tem de se adaptar a uma nova realidade que em muito difere da realidade de um homem livre. Deve-se despir de sua cultura e personalidade em nome da sobrevivência. O considerado bom preso ou preso com bom comportamento não demonstra que pode viver em sociedade, pelo contrário, ele demonstra que se adaptou a um meio totalmente distinto da sociedade livre. O sistema prisional está condenado ao fracasso.
Pode-se concluir, portanto que o sistema prisional brasileiro, que tem por base a pena privativa de liberdade e o Direito Penal máximo, não cumpre a função de ressocializar e não reinseri o preso na sociedade nem como consumidor, nem como produtor (o que almeja o predatório sistema capitalista) e muito menos como cidadão. O que ocorre na verdade é um efeito contrário, a dessocialização do indivíduo que se torna não apto (ou mais inapto) a vida na sociedade padronizada no modelo ditado pelas elites.
Portanto, não se ressocializa, pois seletivamente o Direito Penal já escolhe os indivíduos alijados da sociedade. Ideologicamente o Direito Penal continua fiel a sua teoria de defesa social, de segregação de classes, divisão entre o bem e o mal e de estigmatização de sujeitos. Em uma sociedade desigual e mutável, o direito penal continua impassível, sem se flexibilizar, tornando-se a cada dia mais centralizador e nefasto. 

Livro: Uma Visão Transdisciplinar do cotidiano